Para aqueles que são amantes da natureza...

"Este cerrado é um pouco como o nosso povo brasileiro. Frágil e forte. As árvores tortas, às vezes raquíticas, guardam fortalezas desconhecidas. Suas raízes vão procurar nas profundezas do solo a sua sobrevivência, resistindo ao fogo, à seca e ao próprio homem. E ainda, como nosso povo, encontra forças para seguir em frente apesar de tudo e até por causa de tudo"

Newton de Castro


sexta-feira, 5 de junho de 2015

Giberelinas: reguladores de altura das plantas.

A Descoberta

Na década de 1930, cientistas japoneses obtiveram cristais impuros de dois compostos ativos do fungo Giberella fujikuroi, o qual causava uma doença em plantas de arroz caracterizada pelo crescimento excessivo do talo, responsável pelo acamamento e consequentemente eliminação da produção de sementes. A estes compostos foi dado o nome de giberelina A e B. Na década de 1950, pesquisadores norte-americanos e ingleses elucidaram a estrutura do material purificado do fungo, o qual foi nomeado de ácido giberélico (GA3). 
No entanto, somente no final da década de 1950 é que Jake McMillan, na Inglaterra, conclusivamente identificou uma giberelina em uma planta superior. A medida que as giberelinas de fungos e de plantas foram sendo caracterizadas, elas foram numeradas como giberelina GAX, sendo o “X” o número de ordem de descobrimento (a primeira que foi descoberta recebeu o nome de GA1, a segunda de GA2, e assim por diante). Assim, o número da giberelina é simplesmente um meio para evitar o caos na nomenclatura de giberelinas, não significando nenhuma similaridade química ou relacionamento metabólico. Atualmente, cerca de 125 giberelinas são conhecidas, as quais têm estrutura baseada no esqueleto ent-giberelano. Algumas giberelinas possuem 20 átomos de carbono enquanto outras possuem 19 átomos de carbono, tendo estas últimas perdido um carbono durante a sua formação. Algumas características, como a localização de um grupo hidroxila na molécula e sua estereoquímica, têm forte ligação com sua atividade metabólica. Por exemplo, hidroxilação na configuração β no carbono dois, sempre elimina a atividade biológica. Também, a despeito do grande número de giberelinas presentes em plantas, análises genéticas têm demonstrado que somente umas poucas são biologicamente ativas como hormônio. Todas as outras servem como precursores ou representam formas inativadas. As giberelinas são associadas, mais freqüentemente, com a promoção do crescimento do caule e a aplicação de GAs em plantas intactas pode induzir um marcante aumento na altura da planta. Como poderá ser visto as GAs executam importantes papéis em uma variedade de fenômenos fisiológicos.

Ocorrência, Metabolismo e Transporte

 As giberelinas (GAs) são amplamente distribuídas no reino vegetal. Elas estão presentes em toda a planta, podendo ser detectadas em folhas, caules, sementes, embriões e pólens. As giberelinas constituem uma grande família de ácidos diterpênicos e são sintetizadas por um ramo da via dos terpenóides. Um terpenóide é um composto feito pela junção de unidades de 5 carbonos, o isopreno:



Giberelinas são diterpenóides tetracíclicos formados por quatro unidades isoprenóides. A unidade biológica ativa de isopreno é o Isopentenil Difosfato (IPP). O IPP utilizado para a biossíntese de terpenóides é formado através de duas vias distintas: uma via dependente do Ácido Mevalônico, que ocorre no citosol e está envolvida primariamente na biossíntese de esteróis; a outra via que é independente do ácido mevalônico, é localizada nos plastídios e leva à síntese de carotenóides e compostos relacionados. No plastídio, o IPP é sintetizado a partir de piruvato e de 3-fosfoglicerato e não do ácido mevalônico. Visto que as etapas iniciais da biossíntese de GAs ocorrem nos proplastídios, o IPP usado na sua biossíntese pode ser derivado da via independente do ácido mevalônico.
Diversas observações têm confirmado que, dentre as muitas giberelinas (cerca de 125), a GA1 é a forma ativa que controla o crescimento do caule. No entanto, há possibilidade que outras poucas GAs tenham também participações nesse controle. Por exemplo, a GA3, a qual difere da GA1 somente por ter uma dupla ligação, é relativamente rara nas plantas, porém, parece ser capaz de substituir a GA1 em muitos bioensaios. Outras giberelinas, como a GA4, têm mostrado atividade em Arabidopsis e Curcubitáceae, por exemplo. 
As giberelinas executam um importante papel na mediação dos efeitos de estímulos ambientais sobre o desenvolvimento da planta. Fatores ambientais, como fotoperíodo e temperatura, podem alterar os níveis de giberelinas ativas, afetando etapas específicas nas suas biossínteses. Em adição, evidências recentes indicam que GAs podem regular sua própria biossíntese (Feedback). Quando as plantas que requerem dias longos para crescer e florescer, são transferidas para dias curtos, alterações no metabolismo de GAs são observadas. 
Por exemplo, plantas de espinafre (Spinacea oleracea) mantidas sob dias curtos (SD – short days) permanecem na forma de roseta e, paralelamente, os níveis de GAs ativas são muito baixos. Em resposta ao aumento do comprimento do dia (LD – long days), observa-se, após 12 dias, um aumento considerável nos níveis de giberelinas ativas e, após 14 dias, a parte aérea destas plantas começa a alongar. 
Aplicação exógena de giberelinas ativas em plantas mantidas em dias curtos (SD + GA3), pode também promover o crescimento da parte aérea, indicando que a giberelina substitui o estímulo ambiental (dias longos). 

Crescimento da parte aérea de plantas de espinafre mantidas em dias curtos (SD), em dias curtos e tratadas com GA3 (SD + GA3) e em dias longos (LD) (Taiz & Zeiger, 1998).

Trabalhos com plantas de ervilha indicam que as GAs ocorrem primariamente nas folhas jovens, gemas ativas e entrenós da parte aérea da planta. Estes sítios parecem ser, também, os locais de síntese da GAs. Na realidade, as GAs sintetizadas na parte aérea podem ser transportadas para o resto da planta, via floema. De fato, as etapas iniciais da biossíntese de GAs podem ocorrer em um tecido e a conversão para a forma ativa, em outro. Cloroplastos maduros, por exemplo, não podem realizar as reações do estágio 1 da biossíntese de GAs. Assim, células do mesofilo de folhas maduras (que contêm cloroplastos maduros) são também incapazes de realizar as reações do estágio 1, embora elas sejam capazes de realizar as reações do estágio 3. Estas diferenças sugerem que intermediários da biossíntese de GAs podem ser transportados dos tecidos meristemáticos da parte aérea para as folhas verdes, onde são convertidas para formas ativas de GAs. As giberelinas têm sido identificadas, também, em exsudatos do xilema e extratos de raízes, sugerindo que as raízes podem, também, sintetizar GAs. No entanto, evidências conclusivas para a síntese de GAs pela raízes ainda estão faltando. Muitas sementes e frutos em desenvolvimento mostram, também, altos níveis de giberelinas. Na realidade, o nível de giberelinas ativas decresce para valores próximos de zero nas sementes maduras. Por outro lado, estas sementes maduras contêm GA12-aldeído, precursora de todas as GAs, a qual pode ser convertida para as formas ativas de GAs, durante os estágios iniciais de germinação. Uma variedade de glicosídeos de giberelinas é formada pela ligação covalente entre a GA e um monossacarídeo. Estas GAs conjugadas ocorrem particularmente em algumas sementes. O açúcar é usualmente a glucose que pode se ligar a giberelina via o grupo carboxílico (formando um éster) ou via um grupo hidroxila (formando um éter de glucosil). De fato, quando GAs são aplicadas às plantas, uma certa proporção torna-se glicosilada (conjugada). A conjugação pode, todavia, representar outra forma de inativação das giberelinas. Por outro lado, Glicosídeos de giberelinas aplicados às plantas podem ser metabolizados para formar GAs livres. Neste caso, os conjugados constituem uma fonte de estoque de GAs.

Os processos que regulam o nível de giberelinas nos tecidos de plantas (Taiz & Zeiger, 1998).


Transporte:

Via floema e xilema e é não polar.

Papel Fisiológico

a) Iniciação floral e determinação do sexo

As GAs podem substituir dias longos ou frio, que são fatores requeridos por muitas plantas, especialmente as de hábito de crescimento em roseta, para a promoção do florescimento. Assim, as GAs podem substituir os estímulos ambientais para o florescimento em algumas espécies. As flores de angiospermas consistem, usualmente, de quatro partes (verticílos): sépalas, pétalas, estames e pistilo. Quando as partes feminina (pistilo) e masculina (estame) são encontradas na mesma flor, ela é denominada hermafrodita ou perfeita. 
Certas espécies, no entanto, produzem flores unissexuais ou imperfeitas. O processo no qual as flores unissexuais são formadas é denominado de “determinação do sexo”. 
Em plantas monóicas, tais como pepino e milho, flores macho e fêmea são encontradas na mesma planta. 
Já nas plantas dióicas, como espinafre e Cannabis sativa, estas flores estão em indivíduos separados. O processo de determinação do sexo é geneticamente regulado, porém pode sofrer influência de fatores ambientais, tais como fotoperíodo, temperatura e estado nutricional e, estes efeitos ambientais podem ser mediados pelas GAs. 
Em milho, por exemplo, flores masculinas são restritas ao pendão e as femininas às espigas. No entanto, exposição destas plantas a dias curtos ou frio durante a noite aumenta o nível de GA endógena e, simultaneamente, isto causa a feminilização das folhas do pendão. Essa formação de flores unissexuais depende do aborto de uma das partes no estádio inicial de desenvolvimento. Assim, o papel primário da GA na determinação do sexo em milho, parece ser a supressão do desenvolvimento do estame. 
No entanto, as giberelinas parecem interagir com outros hormônios (por exemplo, o etileno), na regulação da determinação do sexo. 

b) Crescimento do caule

A aplicação de GAs promove o crescimento internodal em um grande número de espécies vegetais. Os estímulos mais evidentes são vistos em variedades anãs ou de hábito de crescimento em roseta, bem como em membros de Gramínea. Aplicação exógena de GA3 causa um aumento tão drástico no crescimento do caule de variedades anãs que elas tornam-se semelhantes às variedades de crescimento normal. Acompanhando o alongamento do caule ocorre um decréscimo na espessura do caule, um decréscimo no tamanho da folha e as folhas ficam com coloração verde-claro. Um ponto interessante é que as giberelinas produzem grandes efeitos em plantas intactas e muito pouco em segmentos. De modo contrário, as auxinas produzem seus efeitos principalmente em segmentos (pedaços de caules, folhas, etc.).
O interessante é que, embora o crescimento do caule possa ser dramaticamente aumentado pelas GAs, elas têm pouco ou nenhum efeito sobre o crescimento das raízes. 
Acredita-se, nesse caso, que a via de transdução de sinal requerida para induzir o crescimento associado às giberelinas, não seja expressa nas raízes. 
Além disso, o caule pode tornar-se um forte dreno por nutrientes da planta. 

c) Transição da fase juvenil para a adulta 

Muitas plantas perenes não florescem até que elas alcancem um certo estádio de maturidade. Os estádios juvenil e maduro destas plantas possuem, frequentemente, diferentes formas de folhas. Aplicação de GAs parece regular a mudança de juvenil para adulto e vice-versa, dependendo da espécie. 
Em algumas coníferas, aplicação de uma mistura de GA4 + GA7 promove a passagem do estádio juvenil para o maduro. 

d) Estabelecimento do fruto

 Aplicações de giberelinas podem favorecer o estabelecimento do fruto (crescimento inicial do fruto seguindo a polinização) e o crescimento de alguns frutos, particularmente nos casos em que a auxina não parece afetar. 
O estímulo do estabelecimento do fruto pelas giberelinas tem sido observado em maçã. 

e) Germinação de sementes 

A germinação de sementes pode requerer GAs em algumas etapas: 

• Ativação do crescimento do embrião; 
• Hidrólise e mobilização de reservas do endosperma (ver mecanismo de ação); 
• Quebra de dormência em algumas espécies. 

f) Aplicação comercial de GAs e de inibidores da sua síntese

• Produção de Frutos → O principal uso de giberelinas (relacionado com a produção de frutos) é para aumentar o comprimento da haste do cacho de videiras. 
Quando essa haste é muito curta, os cachos são muito compactos e o crescimento dos frutos é restringido. 
As giberelinas estimulam o crescimento da haste e, consequentemente, favorecem o crescimento dos frutos (mais espaço); 
Além disso, aplicação de uma mistura de Benziladenina (uma citocinina) e GAs (GA4 + GA7) provoca o alongamento do fruto de maçã, melhorando a sua forma; 
Em frutos de Citrus, aplicação de giberelinas provoca o retardamento da senescência.



• Produção de Cerveja → Durante a produção de malte a partir de sementes de cevada, giberelinas podem ser usadas para acelerar a hidrólise de reservas da semente, pela indução da produção de enzimas hidrolíticas na camada de aleurona.



• Aumento na produção de cana-de-açúcar → Nessa espécie, a sacarose é armazenada no vacúolo central das células do parênquima internodal. A aplicação de GA (pulverização) estimula o alongamento do entrenó e isto resulta em maior produção de biomassa da cana e, também, de açúcares. Alguns resultados mostraram que aplicação de giberelinas pode promover um aumento de 50 toneladas por hectare na produção de biomassa total e de 5 toneladas na produção de açúcar. 
• Inibidores da Síntese de GA → Os compostos conhecidos como retardantes de crescimento, fazem parte de um grupo de biorreguladores que modificam o crescimento e desenvolvimento das plantas, sem, contudo, induzir efeitos fitotóxicos ou de má formação. Quando utilizados em dosagens adequadas, os retardantes de crescimento modificam a arquitetura da planta, inibindo o crescimento do ápice caulinar, reduzindo o crescimento em altura, além de intensificar a pigmentação verde das folhas e aumentar o crescimento radicular. Essas alterações levam à modificação da relação raiz/parte aérea em favor do crescimento das raízes. Os retardantes de crescimento têm aplicações bastantes práticas em termos agronômicos, bem como no melhoramento genético, podendo, por exemplo, ser utilizados na redução do acamamento de plantas, na redução do crescimento de árvores, na tolerância a estresses ambientais e na indução do florescimento. Diversos retardantes de crescimento que têm sido utilizados comercialmente atuam inibindo, de algum modo, a síntese de giberelinas (Ancimidol, Paclobutrazol, fosfon D, etc.). O paclobutrazol bem como os demais triazóis interagem com o citocromo P - 450. A interação faz com que essas proteínas transportadoras de elétrons, que catalisa diversas reações oxidativas do metabolismo vegetal, seja inativada, interrompendo diversas rotas metabólicas, especialmente o metabolismo dos terpenóides (como as giberelinas). O paclobutrazol bloqueia, especificamente, as reações de oxidação entre o ent-caureno e o ácido ent-caurenóico (ver Figura 15, estágio 2 da biossíntese de giberelinas). A aplicação do paclobutrazol reduz drasticamente o alongamento do caule e a pulverização com GA3 reverte tal efeito.
De acordo com dados técnicos da ICI (Imperial Chemical Industries), o paclobutrazol pode ser aplicado em injeções no tronco de árvores e arbustos, diretamente no solo ou por meio de pulverizações diretas nas folhas. Esta última forma permite que o paclobutrazol atinja diretamente os meristemas apicais e entrenós, reduzindo o crescimento da planta. Quando aplicado no solo, o paclobutrazol é absorvido pelas raízes e, via corrente xilemática, é transportado para a parte aérea das plantas.
Os inibidores da síntese de giberelina são largamente utilizados na produção de flores, trigo e algodão e apresentam como nomes comerciais (inibidores) além dos já citados: Cycocel (cloreto de clorocolina); Tuval (cloreto de chlormequat) e Pix (cloreto de mepiquat).

Referências:

FERRI, M.G. Fisiologia Vegetal. Volume II. São Paulo: EDUSP, 1979. 
RAVEN, P.H.; EVERT, R.F.; EICHHORN, S.E. Biologia Vegetal. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 6º ed. 2001. 
TAIZ, L; ZEIGER, E. Fisiologia Vegetal. 3º edição. Artmed, 2003.

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