Para aqueles que são amantes da natureza...

"Este cerrado é um pouco como o nosso povo brasileiro. Frágil e forte. As árvores tortas, às vezes raquíticas, guardam fortalezas desconhecidas. Suas raízes vão procurar nas profundezas do solo a sua sobrevivência, resistindo ao fogo, à seca e ao próprio homem. E ainda, como nosso povo, encontra forças para seguir em frente apesar de tudo e até por causa de tudo"

Newton de Castro


terça-feira, 4 de maio de 2021

Escolas de classificação

Desde os primórdios da ciência o homem aprendeu a classificar com o intuito de compreender o mundo que nos cerca. Isto tem uma utilidade prática. Precisamos descobrir quais plantas eram comestíveis, venenosas, forrageiras etc. 

Classificar é uma ação inerente ao comportamento humano e tem sentido básico de organizar. Ao longo da história, surgiram numerosos sistemas de classificação, os quais costumam ser agrupados em quatro categorias: hábito, artificiais, naturais e filogenéticos.

Baseadas no hábito (árvores, ervas, trepadeiras). Os primeiros foram, evidentemente, os menos elaborados, embora seus autores acreditassem que eles refletiam afinidades naturais. Nestes sistemas, árvores, ervas, trepadeiras, etc., consistiam os grupos principais de plantas. Teophrastus (370-285 a.C.) é o nome mais célebre deste período, sendo considerado o Pai da Botânica.

Teophrastus (370-285 a.C.)

Historia Plantarum

Das 227 obras que chegaram aos nossos dias, duas delas são sobre Botânica: - A História Natural das Plantas (De Historia Plantarum), com posta por 9 livros; Sobre as Razões do Crescimento das Plantas (De causis plantarum) composta por 6 livros. Os livros eram muito gerais, as espécies eram referidas apenas ocasionalmente e em alguns dos casos nem se percebia de que espécie se tratava. Foram descritas entre 500-550 espécies. Foi divulgado o conceito de morfologia, classificação e história. Avançado para o seu tempo, Theophrastus introduziu a prática da aclimatação de plantas, introduziu novos termos técnicos, distinguiu diferentes formas de reprodução e de inflorescências, e estudou a germinação de sementes de várias espécies. 

Dioscórides foi um físico grego, que se tornou cirurgião militar de Nero, o Imperador Romano. O seu cargo militar permitiu-lhe fazer grandes viagens e assim estudar uma grande variedade de plantas. Na obra De Matéria Medica, são referidas as propriedades medicinais de mais de 600 plantas com algumas descrições botânicas, mas sem o caráter científico das obras de Theophrastus. Descreveu raízes, caules, folhas e por vezes flores. Após o trabalho de Dióscorides, com plantas de uso medicinal que vigorou até o sec. XVI, a botânica e a medicina tornaram-se indissociáveis. Os gregos foram mais tarde sucedidos por herbalistas e botânicos que mantiveram este período da história da classificação até a metade do século XVIII. 

Dioscorides de Anazarba (40-90 d.C.)

Página de título De Materia Medica por Pedanius Dioscorides, 1554. ( University of Virginia)

Os herbalistas

Eram médicos que deram grande contribuição ao estudo das plantas. Andrea Cesalpino (1519-1603) era um médico italiano. É um exemplo de um importante herbalista que possui alguns nomes de plantas em sua homenagem, por exemplo: Caesalpinia echinata (pau-brasil). Recentemente essa espécie foi renomeada de Paubrasilia echinata.

Pau Brasil vira gênero de árvore

Andrea Cesalpino (1519-1603)


Paubrasilia echinata (pau-brasil). 

Nesta época surgiram os primórdios da farmacognosia e as primeiras contribuições ilustradas. 

Sistemas Artificiais (séc. XVIII): essencialmente práticos, com poucos caracteres. Não levam em conta afinidades entre os organismos. Ex.: sistema sexual de Lineu (1707-1778). 

Sistemas Naturais (séc. XVIII e XIX): buscavam afinidades “naturais” entre os grupos, segundo um plano divino. Utilizam um número maior de caracteres. Lamarck, Bentham & Hooker, De Candolle, Jussieu. 

Dura até o advento do “Darwinismo” surge os Sistemas Filogenéticos (séc. XIX até hoje): baseados na FILOGENIA dos grupos: histórico de relações de táxons (famílias, gêneros, espécies, populações, etc.) através de ancestralidade e descendência (seguindo Darwin). Assim como aqueles antigos sistemas, os sistemas artificiais não encontram hoje qualquer aplicação. Um sistema artificial tem como único objetivo ser um meio conveniente de situar uma planta dentro de uma classificação e contribuir para a sua identificação. Não tem qualquer preocupação em mostrar relações de afinidades. 

O mais conhecido é o de Linné, (Carl F. von Linné, 1707-1778), publicado na obra “Species Plantarum” (1753), que ficou conhecido como “sistema sexual”, por ter sido o primeiro a dar grade ênfase aos caracteres florais. Em seu sistema, Lineu reconheceu 24 classes, a última delas formada por plantas sem flores (Cryptogamia). Para as classes com flores, os critérios utilizados foram principalmente o número de estames, soldadura e comprimento dos filetes, e o sexo das plantas, segundo o tipo de flores que ela apresenta (Monoecia, Dioecia, Polygamia). 

Linné, (Carl F. von Linné, 1707-1778)

Os sistemas filogenéticos procuram usar toda a informação disponível no momento a respeito dos táxomas envolvidos, procurando relacioná-los segundo uma afinidade baseada em ancestralidade e descendência.

Até a década de 1980, a Botânica foi dominada por um sistema evolucionista de classificação, baseado no grau de similaridades. Nem mesmo a difusão de teorias evolutivas no final do século XIX levou a mudanças significativas na classificação dos seres vivos. A evolução foi incorporada na sistemática como explicação para classificações naturais pré-existentes. 

Foi apenas após o estabelecimento da sistemática filogenética (Hennig 1965), que os táxons passaram a ser definidos por compartilharem características derivadas herdadas de um ancestral comum, as sinapomorfias. O princípio primordial da sistemática passou a ser a ancestralidade, e as classificações passaram a buscar o reconhecimento exclusivo de grupos monofiléticos (ou clados, daí o nome cladística para essa escola da sistemática). 

Sistemas de classificação filogenéticos ou cladístico – Nesse sistema o agrupamento dos organismos é de acordo com o grau de parentesco entre eles. Os cladogramas (ou árvores filogenéticas) demonstram as relações hipotéticas entre os organismos, levando em consideração a sua história evolutiva dos seres. As semelhanças entre os organismos são consequências da existência de um ancestral comum, a partir do qual os grupos divergiram ao longo do tempo. O grau de semelhança entre eles está relacionado com o tempo em que ocorreu a divergência. Os resultados de uma análise cladística são geralmente expressos na forma de cladogramas, ou seja, diagramas ramificados que expressam relações de parentesco entre os táxons incluídos na análise (chamados de terminais ou táxons terminais). Consiste, graficamente, de uma série de linhas (ramos) que conectam esses terminais. O encontro de ramos define um nó, que é considerado um ancestral hipotético do grupo definido por aquele nó. É importante ressaltar que cladogramas representam hipóteses sobre a filogenia de um grupo, ou seja, não é sua filogenia real e sua obtenção depende do método usado na análise. 

A sistemática à luz da genética molecular

Na atualidade a sistemática vegetal usa técnicas moleculares a partir da análises de variação no genoma de cloroplastos em particular, e, em menor extensão, de segmentos do genoma nuclear incrementaram grandemente nosso entendimento da filogenia das plantas em todos os níveis taxonômicos. Um dos objetivos centrais da sistemática tem sido inferir relações genéticas entre grupos de organismos. Uma vez que os dados moleculares (sítios de restrição e sequenciamento de bases nucleotídicas do DNA) provêm o genótipo do organismo, eles fornecem uma evidência mais precisa das relações de parentesco do que podem fazer os caracteres fenotípicos, que podem ser modificados pelo ambiente. Além disso, a homologia de caracteres moleculares é tipicamente mais facilmente alcançada. Atualmente, sequencia de rbcL do genoma de cloroplastos podem ser analisados para a reconstrução das relações filogenéticas entre famílias, ordens e níveis hierárquicos superiores, enquanto sequências nucleares de genes de RNA ribossômicos fornecem informações mais adequadas em nível de gênero e espécie. rbcL é uma grande subunidade do DNA circular do cloroplasto, responsável pela codificação da enzima ribulase-bifosfato-carboxilase oxigenase, importantíssimos nas relações de fixação do carbono durante a fotossíntese). Os dados obtidos com o sequenciamento de nucleotídeos têm sido analisados através dos rigorosos métodos cladísticos. Dentre as Angiospermas, duas linhagens principais na árvore de rbcL correspondem, não aos tradicionais grupos de mono e dicotiledôneas, mas aos grupos produtores de pólen uniaperturado versus produtores de pólen triaperturados. 

Hoje em dia o sistema de classificação utilizado por pesquisadores e estudiosos em Botânica em boas partes das universidades brasileiras é o Sistema de APG (Angiosperm Phylogeny Group), um sistema que revolucionou a classificação botânica ao propor a divisão das Angiospermas em grupos diferentes dos tradicionais sugeridos em outros sistemas de classificação. De acordo com este sistema as Angiospermas estão divididas em quatro grandes grupos: Angiospermas basais, Magnoliídeas, Monocotiledôneas e Eudicotiledôneas. O APG publicou seus trabalhos a partir de 1993, tendo divulgado a classificação mais recente em 2009 (APG III). A tendência hoje em dia com as análises filogenéticas é tentar resolver alguns clados sem grande sustentabilidade em níveis hierárquicos mais inferiores uma vez que em níveis hierárquicos superiores o posicionamento da maioria dos grupos já está sendo considerado estável. 

Classificação por cladograma do reino Plantae

Sistema de Cronquist (1968, 1981, 1988): Esquema das supostas relações evolutivas entre as subclasses de angiospermas. 

Árvore filogenética (cladograma) mostrando as relações entre os taxa de Angiospermas. Análise foi baseada em dados moleculares (sequências de regiões do DNA). Sistema de classificação do APG II.


Referências: 

Sistema de classificação

BARROSO, G. M.; GUIMARÃES, E. F.; ICHASO, C. L. F.; COSTA, C.G.; PEIXOTO A. L. Sistemática das angiospermas do Brasil. Viçosa: UFV, Imprensa Universitária, 2002 (v.1); 1991 (v.2); 1991 (v.3).

CRONQUIST, A. The evolucion and classification of flowering plants. 2ª ed. New York: The New York Botanical garden, 1988.

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